sábado, 15 de novembro de 2014

Encontros amargos

  • Eu resolvi que quero parar a terapia.
  • Ah é, porque?
  • Eu não estou vendo bons resultados.
  • O que seria um bom resultado?
  • Bem, cada vez que tenho vindo aqui, parece que saio pior.
  • Entendo…
  • E ontem quando estava em casa, pensando em vir aqui, foi pior ainda!
  • O que aconteceu?
  • Eu estava me arrumando para ir ao trabalho como em todos os dias e me olhando no espelho me senti muito mal comigo mesma.
  • Você pensou em algo enquanto se olhava?
  • Sim… eu estava me olhando, lembrei da última sessão e pensei que não adiantava nada eu ficar fingindo o meu sorriso porque eu estava triste.
  • E o que aconteceu depois?
  • Eu fiquei triste de verdade… as pessoas notaram no escritório! Eu não posso viver assim entende?
  • Claro que entendo… viver fingindo é muito triste… fico pensando em como seria se você se olhasse no espelho e ficasse feliz em notar que o sorriso que vê é espontâneo.
  • (Silêncio)

As pessoas buscam terapia para se sentirem melhores com elas mesmas. Concordo. As pessoas pensam que o processo para se chegar até aí é composto apenas de bem-estar. Discordo. É como desejar ter preparo físico, mas não querer ficar cansado de correr até atingir o tal preparo, simplesmente não dá.

Por isso muitos dos momentos em terapia são compostos por momentos de dor, angústia e de percepções que desestabilizam o nosso padrão de funcionamento e geram ansiedade e, muitas vezes, medo. Todo terapeuta sabe disso e faz parte da preparação profissional auxiliar a pessoa a suportar e passar por estes momentos. Já disse Stanley Keleman certa vez que a capacidade de suportar vários estados emocionais ao mesmo tempo é o que realmente mostra a nossa maturidade emocional.

A verdade é que todos temos momentos nos quais percebemos coisas sobre nós que não gostamos. A diferença no processo de terapia é que estes momentos são valorizados no sentido de buscar uma nova estrutura de vida junto com a pessoa, ou seja, enquanto no dia a dia deixamos estes momentos escaparem, no processo de terapia eles se tornam  focos. Porque? Não é para fazer ninguém sofrer, tenha certeza disso, mas sim pois são momentos que revelam algo sobre a pessoa e esta revelação precisa ser integrada e trabalhada.

Já tive vários clientes que após entrarem em contato com uma destas partes acabaram integrado-a e começaram a gostar desta parte, aprenderam com ela e este aprendizado as ajudou a melhorar muito a sua qualidade de vida. Outras pessoas tomaram consciência de coisas que faziam e que não gostavam de fazer, mas que mantinham longe da consciência para não ter que lidar com elas. Ao tomar consciência puderam compreender o que as motivava a fazer o que faziam e então estabelecer novas diretrizes para suas vidas.

Se você faz terapia ou não e está num momento no qual está percebendo várias coisas em você que não gosta, ou está em dúvida sobre o que faz no seu dia a dia, desconfiado do seu próprio jeito de ser, não jogue estas percepções fora. Anote-as, deixe-as na mente. Não tente resolvê-las de pronto. É sempre importante saber que é muito difícil resolver isso de “cabeça quente” o melhor a fazer é perceber e manter a percepção para, num momento mais tranquilo, poder refletir sobre o que percebeu.

“O que há de mim nessa percepção?”, “O que não me agrada?”, “O que me motiva à não gostar disso?”, “O que é difícil em perceber isso em mim?”, “Como julgo isso?”, “Quem sou se eu perceber e integrar isso em mim?” Todas essas perguntas podem ajudar você a traçar um panorama mais amplo sobre a sua percepção. Lembre-se de que o fundamental não é fazer a sensação ruim ir embora, mas sim compreender o que motiva esta sensação, perceber todo o enredo no qual ela esta envolvida. Ela é fonte de sabedoria, não jogue isso fora, muito embora seja duro estar em contato com estas sensações. Também não é necessários envolver-se nela e deixá-la tomar conta de toda a sua vida, ou seja, você pode sentir e ao mesmo tempo viver, deixar as coisas de lado durante um tempo e se permitir distrair com o trabalho para mais tarde voltar a entrar em contato com a sensação e estudá-la é algo muito saudável.

Toda emoção é uma mensagem de nós para nós mesmos sobre algo que estamos vivenciando. 

Sempre as leve à sério!